Portal VGV
Na compra de um imóvel, antes da transferência do direito real de propriedade, contratam as partes, comprador e vendedor entre si a obrigação de pagar integralmente um valor e o outro de transmitir a coisa, de modo que se constata a existência de uma relação obrigacional, ou seja, preestabelece-se uma relação obrigacional para posteriormente se concretizar a transmissão do direito real. Dessa maneira, na compra e venda, diferentemente do usucapião, é necessário que o adquirente do imóvel se relacione antes com o atual proprietário, para então alcançar a conquista final do negócio. A despeito, diz o senso natural de auto proteção que se deve analisar bem com quem irá estabelecer uma relação de direitos e obrigações, ponto em que torna-se relevante a análise da qualificação civil.
Ainda, tal exame garante ao comprador que não incidirá em posteriores construções no imóvel ou anulações do negócio. E em primeiro passo, deve-se verificar o nome; o nome do vendedor é importante para se constatar junto ao registro de imóveis se de fato, o imóvel está no nome do vendedor e se ele é o único proprietário. Para tanto, é preciso solicitar uma certidão de matrícula do imóvel objeto do contrato, mas não uma simples, uma vintenária, que consta todos os vinte últimos proprietários do imóvel; nesse documento deve se encontrar o nome do vendedor, ou no mesmo ponto de leitura da descrição do imóvel, ou num registro subsequente ou no anterior. Caso não conste o nome do vendedor na certidão de matrícula, poderá o negócio estar sujeito à evicção então se concretizado. Por outro lado, pode ocorrer que o vendedor tenha o contrato particular de compra e venda ou a promessa de compra e venda não registrados, de modo que esse possui direitos obrigacionais para com o proprietário anterior a ele, isto é, o direito de exigir a transmissão da propriedade pelo ato jurídico perfeito e também da posse, dando força então para se discutir em juízo se alguém vier arguir a evicção. Contudo, pelo fato de existir apenas o contrato particular entre o vendedor e o proprietário anterior, pode acontecer de incidir gravames sobre o imóvel provenientes do nome desse proprietário anterior ao vendedor, como penhora por dívidas por exemplo, isto porque, contratos particulares que versem sobre a propriedade de imóvel não tem validade para terceiro quando do não registro, ficando o dono anterior como verdadeiro proprietário, conforme normatiza o artigo 1.245 parágrafo primeiro do CC.
Em seguimento à confirmação da qualificação civil, é importante verificar o estado civil do vendedor, o que pode ser feito solicitando uma certidão de estado civil ou de nascimento no cartório de registro civil das pessoas naturais domicílio do vendedor, como prescreve o artigo 107 da lei de registros públicos. Contudo, devido a falibilidade humana, pode ocorrer de não haver averbações nas certidões, de modo que será necessário analisar processos judiciais, seja de divórcio, separação e dentre outros, de como ficou decidida pelo juiz a partilha de bens. Algo muito comum nos dias de hoje, é a aplicação do instituto da união estável na vida dos casais, Art. 1.723 do CC, de modo que não é de costume ter formalização documental como deveria, por conta do próprio costume prático de se juntar evitando as solenidades legais. Nesse caso, ainda assim será exigido a participação do cônjuge na relação jurídica, visto que o novo Código Civil no seu artigo 1.723 estabelece que salvo convenção em contrário pelas partes e com formalização em escritura pública, rege a união estável pelo regime parcial de bens, ou seja, incorrem na meação entre os cônjuges todos os bens adquiridos a partir do início da união, exceto os bens particulares, a herança, as doações com cláusula de incomunicabilidade e os demais bens taxados no artigo 1.659 da lei civil. Tal preocupação em verificar o estado civil do vendedor, provém da necessidade do cônjuge ter que anuir com a compra e venda do imóvel, sob pena de nulidade, conforme os termos do inciso I do artigo 1.647 do Código Civil, autorização conhecida como outorga uxória. Porém, há duas situações que certamente não necessita da citada autorização, possibilidades que são novidades do novo diploma civil de 2002, a saber:
1ª. O regime de separação total dos bens, desde que tenha sido o casamento realizado na vigência do Código Civil de 2002, posto que o anterior de 16 obrigava a autorização do cônjuge na alienação de imóvel, arts. 235 e 242 do Código Civil de de 1916.
2ª. Regime de participação final nos aquestos, já que cada cônjuge tem o seu próprio patrimônio, Art. 1.673 parágrafo único, lembrando que em caso de término do casamento, os bens poderão se comunicar, como prescreve o artigo 1.674 do CC.
3ª. O empresário não necessita da autorização conjugal para venda dos imóveis, desde que seja tal imóvel parte do patrimônio da empresa, isto é, ao exercício da atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços, conforme o artigo 978 do Código Civil
Devidamente estudado o nome e o estado civil do vendedor, é relevante também observar a validade da assinatura no contrato, a fim de evitar que alguma falsificação de assinatura, como a do cônjuge, de um herdeiro ou qualquer outra causa que possa levantar uma discussão sobre vício na declaração de vontade, o que poderia invalidar o negócio, nos termos do artigo 104 do Código Civil, e para se precaver, o aconselhável é que todos os contratos de compra e venda sejam reconhecido firma das assinaturas.
Um ponto bastante comum é solicitar às partes do contrato que apresentem original e cópia da sua cédula de identidade, algo que apesar de um ato simples é de relevância, visto que evita-se ter menor não emancipado como parte do negócio, que pode levar na posterior nulidade do contrato com efeitos extunc, conforme prevê o parágrafo único do artigo 1.691 do CC, visto que é imprescindível para a venda de imóvel de pessoa incapaz, a autorização judicial, conforme os artigos 1.691 e 1.750 do CC, e mesmo ocorrendo a venda, deverá o comprador guardar consigo a decisão definitiva prolatada pelo juiz, bem como o alvará, a fim de futuramente demonstrar a boa-fé do negócio jurídico se necessário, pois poderá ser propostas ações anulatórias posterior à venda.
Portanto se compreende pelo estudado que a averiguação profunda da qualificação civil das partes contratual, e não somente qualificá-las no bojo do contrato sem fazer qualquer pesquisa, poderá emergir no decorrer do negócio, ou até mesmo posteriormente a concretização da venda, vícios graves que poderão prejudicar ou o vendedor, ou o comprador ou também o corretor de imóveis. Mas, se Adotadas tais providências básicas, em análise à qualificação civil das partes, estejam seguros os contratantes em prosseguir com a sua negociação.
*Vinicius Monteiro é formado em Direito. É dono do seu escritório de advocacia, Monteiro Advogados. Presta serviços de análises de documentos e contratos, consulta e atuação jurídica para empresas e pessoas físicas, tendo como seu principal seguimento o direito que regula o mercado imobiliário, sobretudo, também atuamos com mão forte no direito civil e trabalhista.